Resenha
do Romance Senhora de José de Alencar
Por Prof. Ms. Carlos
Henrique Ferreira Nunes[1]
Senhora
é um romance escrito no século XIX, pelo escritor romântico, José de Alencar.
Trata-se da saga de uma heroína: algo pouco comum naquela época na qual imperava
o machismo na sociedade brasileira do período imperial.
O romance se divide em quatro partes que simbolizam transações financeiras, e portanto, o ambiente no qual a obra foi desenvolvida - a corte carioca do período imperial, formada por uma aristocracia com aspiração à classe burguesa. Aliás, o romance em questão figura como urbano ou de costumes, retratando exatamente o pensamento aristocrata e burguês naquele instante histórico. Com poucos personagens de destaque, pode-se afirmar que todo o enredo gira em torno do casal Aurélia Camargo e Fernando Seixas.
A
protagonista da narrativa (Aurélia Camargo) era uma menina pobre, criada apenas pela
mãe, pois seu pai havia morrido e sua mãe nunca fez questão de procurar a
família dele, pois sua união não era bem vista pelas diferenças de classe
social. No auge de sua adolescência e com uma beleza fascinante, a jovem
despertava interesse em muitos solteiros disponíveis na cidade do Rio de Janeiro, em
especial, o jovem e ambicioso Fernando Seixas, que chega a noivar com nossa heroína.
No entanto, o compromisso foi rompido quando
Fernando recebe uma proposta para casar-se com uma moça da sociedade pela quantia de uma dote de 30
mil contos de réis. E assim o fez, abandona a pobre Aurélia. Mas o destino de
repente a surpreende: recebe a notícia de que seu avô paterno havia falecido, e
não tendo herdeiros, toda a sua fortuna lhe cai nas mãos. Torna-se-ia não só a mais bela,
mas, também a mais rica moça em disponibilidade da corte.
A
partir daí, suas idas às festas eram rodeadas de candidatos a lhe desposar.
Porém, a bela Aurélia não era nada ingênua, sabia muito bem administrar seus
bens e fortuna, e observava com desprezo todos aquele homens oportunistas que
certamente buscavam ascensão através sua beleza e riqueza. A protagonista ironizava
e dizia-lhes na “cara” o quanto valiam, ou quanto poderia pagar de dote para se casar.
Apesar
dos flertes constantes, a jovem nunca havia tirado de seu pensamento seu
ex-noivo – Fernando Seixas. Este, no entanto, ainda não havia se casado, mas
sim encontrava-se noivo de outra moça – Adelaide Amaral. Através de seu tio e
tutor, o Sr. Lemos, Aurélia faz uma contraproposta: que Fernando deixasse Adelaide para se casar com uma moça rica da sociedade(ela própria), sem que, no entanto, ele soubesse de quem se tratava: algo que somente lhe seria revelado diante do altar. E assim
acontece, o jovem ambicioso aceita o trato pela quantia de 100 mil contos de
réis, dos quais de imediato adianta 20 mil para pagar dívidas urgentes.
O
casamento acontece, mas somente no papel, durante longos meses Aurélia Camargo exige de
Fernando a respeite diante do público e nos meios sociais, no entanto, no interior de sua casa
tratam-se como estranhos. A indiferença de Aurélia, e o fato de desta ficar lembrando insistentemente o fato de que o rapaz de vendeu por duas vezes seguidas o machuca por dentro. A dor tem um efeito catártico (de transformação do personagem), que o faz aos poucos mudar seu caráter: começa a trabalhar e juntar dinheiro para
tentar se tornar independente da esposa, e assim lhe devolver a quantia adquirida com o dote.
Evidente que sendo um romance romântico tudo dá certo no cair do pano:
o sofrimento é transformado em alegria; a dor do casal em felicidade completa.
Ainda assim, vale
a pena re-visitar este clássico. Na minha modesta opinião, o melhor romance de
Alencar. Teria minhas críticas a fazer, no entanto, devemos ter em conta a época, o
contexto histórico e a formação do autor para compreender a ausência de
personagens negros (naquele momento oficialmente escravos); as personalidades um tanto simplistas demais e delineadoras de clichês que vão desamarrando um enredo no
qual já se prever o fim. Apesar disso, a análise estética e literária aponta
para recursos preciosos em seu estilo, como uma linguagem poética inscrita em sua narrativa, bem como as representações pré-realistas das tradições e a cultura na corte como similares a realidade na qual
se vivia no Rio de Janeiro no período imperial. Além disso, é a própria protagonista através lances irônicos que nos garante uma certa diversão e leveza ao tom discursivo do
texto.
Aurélia
encarna a típica heroína romântica e moderna, cuja a grande tarefa é emancipar-se dos
desmandos de seu tutor e do marido para tornar-se algo além de um objeto, ou seja, sujeito e senhora capaz de determinar para si qual seu futuro.
REFERÊNCIA:
ALENCAR. José de. Senhora/ Iracema. Clássicos Scipione. (Textos integrais). Introdução e comentários de José de Nicola. 1º ed. São Paulo: 2003.
[1] Graduado
em Letras português/ inglês pela Universidade Estadual de Alagoas(UNEAL);
especialista em Língua Portuguesa pela Universidade Barão de Mauá – SP; Mestre
em Educação pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL); professor da rede
pública municipal de Arapiraca.