quarta-feira, 21 de novembro de 2018


RESENHA DO LIVRO HISTÓRIAS EXTRAORDINÁRIAS DE EDGAR ALLAN POE

Por Carlos Henrique Ferreira Nunes[1]

            Trata-se de um livro muito bom, que teve como tradutora e adaptadora nada menos que a escritora Clarice Lispector; aquela mesma, que escreveu A hora da estrela, Felicidades Clandestina, Laços de Família e tantas outras obras fantásticas de nossa literatura moderna em sua terceira fase. Este livro, como já mencionado, fora adaptado com o propósito de tornar o texto de Poe, de certo modo, mais adequado ao público infanto-juvenil para que este tivesse contato com um gênero que talvez hoje seja mais explorado e tenha muitos adeptos, mas que até então, voltava-se mais aos clássicos ou histórias de aventura, falo do gênero contos de terror e mistério.
            Bem, o próprio autor, Edgar A. Poe, tem sua vida marcada pelo mistério e por uma atmosfera sombria, pois tal qual acontecia com muitos escritores do período romântico, a melancolia e a morte sempre o acompanharam, sobretudo, quando estas vem impactadas por circunstâncias tais como a doença e morte de sua mãe, o desaparecimento de seu pai; a morte prematura de sua esposa; o vício do álcool e do ópio, a boemia típica dos intelectuais do séc. XIX (Século do romantismo e do mal-do-século, que era a tuberculose). Este escritor norte-americano nascido em Boston em 1809, foi e é até hoje, considerado um percursor das histórias de terror, suspense e investigação policial, tendo inspirado dezenas e milhares de outros autores, ao teatro e ao cinema, que tem no investigador Dupin certamente a montagem estrutural de um personagem típico das histórias de investigação policial que se assiste hoje em seriados na TV.
            O livro inicia com uma introdução escrita por nada menos que o poeta Charles Baudelaire, ícone da poesia lírica moderna francesa e universal, na qual admite a respeito de Poe que o seu “(...) vasto saber, o conhecimento de várias línguas, os sólidos estudos, as ideias colhidas em diversas viagens por outros países faziam de sua palavra um ensinamento incomparável (...)”. A obra conta com uma seleção de 18 contos distribuídos ao longo de 161 páginas. Para mim é difícil escolher os melhores: são todos, a seu modo, espetaculares. Mas gostaria de registrar a importância pessoal de dois deles, pois, estes me serviram de inspiração e base para a produção de duas adaptações teatrais, a saber, são os contos O gato preto, cuja a imagem do felino ilustra a capa deste livro publicado pela Editora Ediouro em 2005; e o outro, intitula-se Nunca Aposte a cabeça com o Diabo. Além da tensão psicológica típica de seus contos, com estes dois em particular pode-se visualizar bem as ações. Então, a partir da organização de um roteiro e adaptação textual da prosa (narrativa) para o discurso direto e dialogado do teatro pôde-se pôr em ação no palco seus personagens. No entanto, ressaltamos que alguns personagens tiveram seus nomes criados para adaptação, pois na maioria dos contos de Poe estes não têm seus nomes mencionados. Além disso, sabe-se que os contos têm por característica o fato de possuírem poucos personagens, assim a ação é bastante focada em torno de um único acontecimento, bem diferente do romance, que pode variar na quantidade de personagens e narrativas que se entrecruzam na obra (BAKHTIN, M. 2002).
            Importante destacar nesta obra, o que a torna indispensável à leitura, é também o fato de nela está presente uma obra-prima, exatamente a que compõe as histórias de investigação policial que terão como grande figura o investigador Dupin; trata-se de Os crimes da rua Morgue. Esta narrativa um pouco mais longa do que as demais, mas não menos interessante, na qual nosso detetive vai no encalço de um assassino em série, responsável por mortes misteriosas. A maioria dos contos é curto, no entanto, são bastante densos e exigem de nós uma imaginação criativa para produzir determinadas imagens, nas quais, mesmo o seu autor tendo escrito há tanto tempo não perdem seu vigor e atualidade. Poe, assim como grandes escritores da envergadura de Shakespeare puderam através de seus personagens colocar lado a lado ficção e realidade, e desse modo, nos colocar também diante de um espelho para encarar frente a frente nossos medos, angústias, nossas fraquezas, e com elas a possibilidade de refletirmos diante da fragilidade humana e de sua inclinação para o mal.
Com narrativas ora em primeira pessoa, ora em terceira pessoa, mas que mantem igual realismo, uma das características mais interessantes que constituem a narrativa de Poe é que esta (propositalmente) nunca nos deixa claro se os fatos ali ocorridos são em consequência de algo sobrenatural (intervenção do Diabo ou de Deus) ou simplesmente seriam os frutos ou as flores do mal[2] colhidas por aqueles que as plantaram. Todos os seus personagens têm em comum uma terrível obsessão por algo: animais, jogos, bebidas, mulheres, dinheiro. Não importa o vício, podemos tirar como lição de suas obras que, seja qual for o vício (obsessão), quando este é levado às últimas consequências o resultado é sempre trágico. E quantas vezes nós, em algum momento da vida, ou agora mesmo não nos prendemos de modo “cego” a algo? Vale muito apena ler este livro, sempre que o lemos descobrimos detalhes que só a maturidade e o passar do tempo nos revelará com mais clareza.

REFERÊNCIAS:
Poe, Edgar A. Histórias extraordinárias. Tradução e adaptação de Clarice Lispector. (Clássicos para o jovem leitor). Rio de Janeiro: Ediouro, 2005.

BAKHTIN, M. Estética da Criação Verbal. 6° Ed. Rio de Janeiro: Martins Fontes: 2011.




[1] Graduado em Letras português/ inglês pela Universidade Estadual de Alagoas(UNEAL); especialista em Língua Portuguesa pela Universidade Barão de Mauá – SP; Mestre em Educação pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL); professor da rede pública municipal de Arapiraca.
[2] Consequências do caos da vida moderna: consumismo, desemprego, guerras, egocentrismo etc. Este é o título do livro de poesia de Charles Baudelaire, escrito em Paris – capital do capitalismo moderno no século XIX.

terça-feira, 20 de novembro de 2018

CAPITU 

Vossos olhos me lembram

A ressaca das ondas,
Lembram-me luas redondas.

E quero tê-los descansados;

Castanhos, brilhantes,
Pousarem nos meus.

Vossos olhos me lembram

Imensas cascatas
De águas plácidas
que docemente se quebram

E quebra-se meu coração

E quebra-se a fortaleza.

Vossos olhos me lembram

Um sol ameno
Uma luz benigna
Que já não é mais a mesma
Mas também não sou o mesmo.

(NUNES, C.H.F. Cantos Juvenis (poesias). 1º ed. Arapiraca: Edições Livres: 2018.)


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Olá amigos e amigas!!! Todos que são apaixonados pela Literatura e pela arte em geral. Este Blog foi criado com o intuito de servir como difusor de resenhas, eventos e análises acadêmicas (científicas) de grandes obras, sejam clássicos ou obras mais contemporâneas. Além disso, pretendo utilizá-lo como ferramenta pedagógica junto a meus alunos divulgando seus textos ou os meus realizados individualmente ou em co-autoria. Sejam bem-vindos!