terça-feira, 5 de janeiro de 2021

 

Viagem ao Centro da Terra, de Júlio Verne

 

Viajar ao centro da terra é uma experiência fantástica. A obra de Júlio Verne nos torna viajantes, aventureiros, expedicionários de uma Europa distante, pouco conhecida. Do leste europeu aos confins subterrâneos, e enfim, ao núcleo da terra. Três argonautas do subsolo, dos quais um deles nos oferece seu olhar curioso de geólogo e sua voz para narrar uma viagem na qual se pode aprender bastante, mas também, se corre muitos riscos, inclusive, de não retornar à superfície terrestre. A obra Viagem ao Centro da Terra, de Júlio Verne se divide em 45 capítulos, que totalizam 303 páginas, que nos envolvem a cada uma que atravessamos. Nos primeiros capítulos, conhecemos os seus personagens principais, e um pouco de seus hábitos e rotina: Axel, protagonista e narrador; Professor Lidenbrock, seu tio e maior entusiasta da expedição; e Hans, uma espécie de assistente e guia local. Seu ponto de partida é a cidade de Hamburgo na Alemanha. Mas a aventura pelo subsolo se dar a partir de sua chegada ao monte Sneffels, na Islândia. Eles têm, entre outras coisas, como instrumentos uma bússola, e um diário. O tio de Axel era professor de mineralogia em uma universidade alemã, e ele queria seguir os seus passos, e, portanto, era apaixonado por tudo que se relacionava ao conhecimento do solo e dos minerais por ele velados como tesouros. A cada camada em que descem mais profundamente em direção ao núcleo da terra, mais tensa e perigosa se apresenta a travessia. Em um determinado momento eles se perdem na total escuridão a quilômetros de distância da superfície. Noutro, a água potável acaba e os aventureiros ficam a um triz de morrerem de sede. Para aqueles que são amantes da geografia, sobretudo da geologia, amarão este livro, para quem é de outras áreas como eu, também apreciará a mistura de ciência e ficção que embala esta obra escrita no século XIX, mas que mantém sua jovialidade e se consagrara como um cânone (clássico) na literatura francesa e universal, chegando ao séc. XXI sendo uma das obras mais lidas e traduzidas do mundo. Não vou dar spoiler, vão lá conferir. Abraços, e até a próxima resenha.

 

Resenha escrita por Carlos Henrique Ferreira Nunes.

 

REFERÊNCIA:

 

VERNE, Júlio. Viagem ao Centro da Terra. Trad. Juliana Ramos Gonçalves. Jandira – SP: Principis, 2019.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2020

 RESUMO, RESENHA E RESENHA CRÍTICA 

RESUMO - Entende-se por resumo um texto que sintetiza, ou seja, traduz em poucas palavras, ou poucas linhas do que se trata determinado livro. O resumo nos permite visitar o conteúdo de um livro que lemos, e ter uma ideia geral sobre ele, no entanto, sem precisar ter que lê-lo todo novamente. Para  escrever o resumo, não deixe de mencionar o nome do autor(es) e do livro do qual o resumo trata; lembre-se de fazer anotações e não esquecer as informações mais importantes; pode-se fazer uma lista dessas informações, e depois usá-las para escrever o texto.                                                                        

RESENHA. Na resenha deve-se descrever uma determinada obra/livro. Como assim? O leitor de resenhas quer saber não somente do que se trata um livro, mas quer ter mais informações técnicas sobre o mesmo. Na resenha, semelhante ao resumo, não se deve dar opinião, mas simplesmente descrever os aspectos físicos e o conteúdo de modo objetivo/descrito, sem elogiar ou criticar estes aspectos. O julgamento deve ficar por conta do leitor. Uma boa resenha deve despertar o interesse do leitor em ler o livro, no entanto, sem influenciar em sua apreciação.   Deve-se indicar a faixa-etária (idade) e os tipos de público que poderiam se interessar por seu conteúdo, bem como autor, obra, editora, ano de publicação, número de páginas, entre outras informações que julgar importantes.           

RESENHA CRÍTICA. Este gênero difere do anterior (Resenha) pelo fato através dele se emitir um juízo de valor, ou seja, por dar opinião a respeito de uma obra. Mas não se trata de uma opinião vazia do tipo "gostei ou não gostei", "é legal", "é interessante". Deve-se apontar o que o agradou ou desagradou, bem como explicar o porquê, ou seja, justificar, fundamentar. Por exemplo, "não gostei da obra Grande sertão:veredas porque seu autor usa muitos neologismos (palavras inventadas), o que torna a narrativa  mais lenta, pois tens que tentar deduzir o que significam. A mesma característica acima criticada por um resenhista poderia ser elogiada por outro, que diria "o livro é excelente, e o autor muito criativo, chegando a inventar palavras que nos levam a refletir, embora tenhamos que parar para pensar em seus prováveis significados".  Seja para fazer uma crítica positiva ou negativa, o autor (resenhista) deve ter conhecimento técnico sobre o aspecto que o agradou ou desagradou. Em se tratando de uma obra  literária estas podem ser: a linguagem, o enredo (história), os personagens, a qualidade da tradução (quando o livro é estrangeiro), a qualidade do material (o acabamento, o designe) do livro físico, as imagens ou ilustrações. Em suma, a Resenha Crítica exige mais do que um resumo (descrição) ou resenha(descrição e informações técnicas), e pode sim, influenciar ao leitor que deseja ler uma determinada obra e busca informação antes de iniciar esta leitura, pois faz uma análise e cotejamento.      

domingo, 13 de dezembro de 2020


MELO, Fábio de. É Sagrado viver. São Paulo: Planeta, 2012. p.176
 
        Em É sagrado viver, Pe. Fábio de Melo nos apresenta narrativas na forma de crônicas, que muitas vezes flertam com a poesia, não fosse a disposição das orações no papel no formato de prosa, poderíamos sim ter alguns poemas que saltariam de suas páginas.
        As crônicas não seguem uma ordem cronológica ou uma temática em particular, tratam de assuntos dos mais diversos, mas, na maioria deles se revela seu profundo sentimento de compaixão para com os infortúnios das pessoas mais humildes, ao tempo que desvela em seus gestos a presença do sagrado. A linguagem da arte, os gestos de amor e o silêncio podem, cada qual ao seu modo, ser um momento de epifania de Deus em nossas vidas. Fábio de Melo faz descrições de pessoas anônimas em situações corriqueiras, e consegue capturar em suas ações e gestos um Jesus transfigurado, um Jesus que nos pede um olhar mais demorado sobre as coisas que realmente são importantes, e sobre as pessoas que devemos cuidar. E este olhar, ao paralisar ou fotografar aquela situação, aquele gesto também denuncia o quão muitas vezes estamos distantes da realidade, pois estamos imersos no mundo do trabalho, da velocidade e da mecanização da vida, que nos faz agir como se estivéssemos vivendo guiados por controle remoto.  
      A leitura deste livro também nos faz conhecer um pouco mais sobre a vida e algumas posições pessoais de Fábio de Melo. Evidente, que mesmo sendo ele escritor, não deixa de ser padre, professor e artista, e todos estes aspectos da formação do autor se encontram presentes nessa obra. A racionalidade diante da força avassaladora do tempo, que para nós pode parecer o começo do fim e para outros apenas uma mudança natural de fase ou estágio que se manifesta aí sob o prisma da finitude e infinitude. Não se trata de um livro de autoajuda como alguns possam imaginar, ao contrário, temos reflexões filosóficas e questionamentos sob os quais o próprio autor faz indagações sem nos apresentar respostas prontas ou fórmulas, ao contrário. Mas tudo isso usando uma linguagem coloquial, quase como um tom de conversa.
        Mesmo a teologia católica ou cristã estando como pano de fundo de suas reflexões, de suas narrativas, que ora contam histórias de personagens reais, ora versam sobre temas como a música ou a poesia, este fato não tira a relevância nem a beleza de seu texto que nos põe diante do espelho, diante de realidades que muitas vezes vivemos, mas experimentamos, não tiramos dali numa experiência significativa, exatamente porque estamos sempre com pressa, e aí a vida passa e não enxergamos o sagrado que estava  ali  tão perto, ao nosso lado.
Neste tempo de pandemia e de tanto pessimismo, a leitura desse livro pode nos alentar e nos ajudar a tirar algumas traves dos olhos, valorizando e se demorando sobre as pessoas e as coisas que são mais importantes para nós e que nos ajudam a atravessar juntos a tempestade de hoje e as que virão. Recomendo para todos os públicos, sobretudo, para pessoas adultas, sejam elas religiosas ou não. Vale apena. Um grande abraço! Leiam e deixe aqui seus comentários e impressões. 

         Resenha Crítica de Carlos Henrique Ferreira Nunes

quarta-feira, 7 de outubro de 2020

PAULO FREIRE, ETERNO MESTRE!

 

PAULO FREIRE, ETERNO MESTRE!

 

Paulo, meu amigo e camarada;

Sua luta é nossa luta

Estamos na mesma empreitada:

Educação não é tudo,

mas sem ela não somos nada.

 

Não se educa o cidadão

Senão lhe aponta quais os desafios

Que se insurgem

No meio da caminhada.

 

Do Campo à cidade

Sua pedagogia é uma lição

De que o povo para ser livre

Não deve esperar pelas chaves do patrão,

só ele mesmo pode ser protagonista de sua emancipação.

 

Ir além do soletrar

Ir além do suor salgado

Ter direito a sonhar

Coisa que não faz o gado.

 

Na ponta da língua

Palavras de amor e sabedoria,


Daquele que em tempos de autoritarismo resistia

Como guerreiro de fé, como bom pernambucano,

Alfabetizando e ensinando pelo Brasil,

Que o fez com justiça

Patrono dessa pátria mãe

Que nem sempre foi gentil.

 

Freire sempre citado

Em todo o mundo tem raízes,

Pois onde houver oprimidos,

Dentre eles

Terás o seu nome conclamado,

e na lição aprendida,

Eis a mais importante:

Gente é ser humano;

Tem esperanças e sonhos;

Não merece ser tratada como gado.

E assim seguimos

Sua pedagogia progressista;

Resistindo as ondas fascistas

Que nos querem todos destroçados!

Um abraço camarada a este homem

 Que mesmo não estando mais aqui

Estará sempre ao nosso lado!

 

(Henrique Nunes. 19.09.20)

CARONA DE CANDIDATO


 








Meu compadre Severino
Me apresentou certo dia,
Com a maior alegria
Ao dotô Zeferino.
E este, muito grã-fino,
Tratou-me dentro das norma;
Apertou a minha mão
e disse: - Satisfação!
Eu disse: - Da mesma forma!

Depois me deu seu cartão,
O retrato, o endereço.
Eu disse: - Assim não mereço!
Disse ele: - Faço questão!
Ainda me perguntou
Onde era a minha casa.
Eu lhe respondi: - No sítio,
Muito pra lá da Ceasa.
Ele acendeu um cigarro
E disse: - Entre no meu carro,
Comigo ninguém se atrasa!

Quando ele disse aquilo,
Meu coração deu um sarto,
Eu já ando disconfiado
Com essa onda de assarto.
Mas depois pensei comigo
Que aquele cidadão
Não podia ser um ladrão,
Afiná era um doutô.
Quando eu vi o carro novo
E o toca-fitas tocano,
Eu logo fiquei pensando:
- Isso é um conquistador!

Pensei nas minhas menina,
Pensei também na muié.
Mas depois pensei comigo:
- Seja lá o que Deus quisé!
Entrei no carro do home
E o home empurrou o pé.
- Ô carro novo danado,
Ô homem conversador!
Eu chega tava acanhado
Pra conversar com o dotô.

Foi me deixá lá em casa,
Subindo ladeira e grota.
Ao meu guri mais novo
Ainda deu uma nota.
Cumprimentou com respeito
Minhas fia e a mulhé,
E aceitou com muito gosto
Cuscuz de mi com café.

Depois que o homi saiu
Fiquei de braço incruzado
Pensando comigo mermo:
- Ô cidadão educado!
Daquele dia pra cá,
Onde o home me encontrava,
Ainda que fosse correno,
Quando me via, parava.
Abria a porta do carro,
Mandava entrar e eu entrava.

E se tivesse bebendo
Com uma trurma de amigo,
Deixava os amigos lá
E vinha falar comigo.

Um dia, eu cheguei num bar,
Perto da banca de jogo,
E lá estava o dotô,
Bebendo, “puxando fogo”.
Quando ele me avistou
Veio logo pro meu lado,
Dizendo: - Vamos beber
Comigo no “reservado”?
Aí eu pensei comigo,
Já meio desconfiado:
- Ou esse dotô é santo
Ou pensa que eu sou viado.

Mas aí olhei o home
Desde riba inté embaixo,
E eu vi que ele tinha jeito
De um cabra muito macho.
- Eu também não levo jeito
Pra certas coisas, patrão!
E finalmente eu aceitei
Entrá com o cidadão.

Ele sentou-se numa mesa,
Do seu lado eu me sentei.
Olhou bem na minha cara,
Na sua cara eu olhei.
Ele olhou pro garçom
E depois falou assim:
- Garçom, traga por favor
Uma dose dupla de Gim.
Aí eu disse: - Seu moço,
Traz uma cana pra mim!

Nisso o garçom saiu,
Isperto que só raposa.
Foi quando o home me disse:
- Vou lhe pedir uma coisa!
Eu disse: - Pode pedir,
Não precisa se acanhar.
Não sendo o que tô pensando,
Poderei até lhe dar.

Então o homem sorriu
E foi me dizendo: - Eu noto
Você meio disconfiado,
Se pro seu lado eu me boto
Eu só quero de você
E da família é o voto!
É que eu sou candidato,
Quero ser vereador.
Pra ajudar essa pobreza,
Esse povo sofredor.

Foi quando eu disse: Dotô,
Eu voto em Massaranduba,
Minha mãe em Cabrobró,
Minha mulhé em Natuba.

Minhas fias em Cochichola
E papai lá em Pipirituba.
Então, por esse motivo,
Não vou votar no senhor.
Quando olhei para o home,
Tava mudando de cor.

Não disse uma nem duas.
Não falou e não sorriu.
Olhou de longe o garçom,
Chamou com um “psiu!”
Puxou do bolso a carteira,
Pagou a conta e saiu.
Daquele dia pra cá,
Eu confesso a vocês, meu povo:
Nunca mais tive o direito
De andar de carro novo.

 

(GERAÇÕES. Coletânea de Poesias. Ademar Bogo (Org). Editora Expressão Popular: São Paulo, 2002.)

 


sexta-feira, 4 de outubro de 2019



A TERRA DOS MENINOS PELADOS. Graciliano Ramos. 1ºed. Cameron, Rio de Janeiro: 2018.

Este livro – A terra dos meninos pelados – do consagrado escritor brasileiro e alagoano Graciliano Ramos foge um pouco dos modelos narrativos de obras como Vidas secas, São Bernardo ou Histórias de Alexandre. Pois essa obra dar-se a entender voltada para as crianças. No entanto, quem disse que os adultos não precisam aprender sobre o lidar com “o diferente”?
         A história é desenrolada ao longo de 23 capítulos curtos, provavelmente uma forma de não cansar o leitor mirim ou menos habituado. Mas a história é fascinante e cheia de surpresas. Animais fantásticos (falantes), seres fantásticos (objetos falantes), uma princesa, e o seu narrador – Raimundo Pelado – um menino (criança) que se sente rejeitado pelos demais colegas por ser careca, e ter um dos olhos preto e o outro azul. De fato, algo bem inusitado. No caminho de volta da escola, ao se esconder de uns garotos, acaba se perdendo e indo por um caminho que mais parece um sítio distante. Mal sabia ele que aquele caminho o levaria uma terra mágica (Tatipirum) onde as pessoas e os seres que lá habitam teriam muita afinidade com ele, e enxergariam na sua excentricidade grande beleza.
         Um traço interessante da obra em questão é a construção de imagens narrativas de caráter pictórico, ou seja, que em suas passagens remetem a desenhos animados ou a pinturas surrealistas(retrata os sonhos). Um ótimo exercício de imaginação. Mesmo sendo eu adulto, acho que sou, eu particularmente aprecio desenhos animados e ler obras consideradas infantis. Mas devemos ter cuidado com obras que infantilizam as pessoas, ou seja, que não apresentam senso crítico, apenas reproduzem preconceitos e estereótipos da sociedade. O que não é o caso da obra A terra dos meninos Pelados.


         Esta obra, entre outras questões, trata das pessoas “especiais”, nos aponta que não há nada de mais em ser semelhante ao outro, igualmente não há nenhum problema em ser diferente. Em todos lugares que formos nos depararemos com ambas as situações. Isso fica claro, pelo fato de Raimundo descobri aquela terra maravilhosa, onde todos o respeitam, e têm traços físicos com o menino-narrador, e apesar do acolhimento, ele não quer deixar de voltar para casa, para a escola, e encarar o “choque” das diferenças. Será que aqueles meninos da escola ainda zombariam dele por ser diferente?

         Em Tatipurum, Raimundo fez muitas amizades. Ele vai embora, mas promete a todos voltar para visitá-los. Ele aprende a amar a singularidade de cada ser com qual estabeleceu amizade. E no fundo, isso é o mais importante. Esta obra pelo que percebemos é atualíssima, pois mais do que nunca vivemos o drama da exclusão social e do preconceito no nosso cotidiano: preconceito pela cor, sexualidade, origem social, pela linguagem, pelo grau de escolaridade, pela capacidade física. Enfim, é um combate o qual a educação tem um instrumento mais do útil, necessário – O livro – letramento literário e sensibilização através da arte. Eis o grande desafio.

RESENHA escrita por Carlos Henrique Ferreira Nunes.

domingo, 15 de setembro de 2019


UMA HISTÓRIA VITORIOSA(Aluna: Ana Clarisse Serafim Santos. 6° "b"; Escola José Pereira Sobrinho)



Meu nome é Eraldo Erasmo de Oliveira. Eu nasci em 1957, aqui mesmo no sítio Baixa do Capim, no município de Arapiraca, pertencente ao Estado de Alagoas. Por essa época prevalecia a cultura do algodão, do milho e do fumo. Aqui não havia cercas nas propriedades, mal existiam estradas ou calçadas; nem bicicletas se via por aqui. A maioria andava a pé e descalço.
Eu e muitas crianças daqui trabalhávamos para comer. Eu mesmo tinha vontade de ir à escola, mas não podia. Foi somente em 1972 que construíram uma escola, e mesmo velho eu comecei a estudar naquele ano. O terreno onde foi construída a escola fora doado por Miguel Januário, um grande companheiro e pioneiro aqui na nossa região. Ah, nas baixadas aqui do sítio havia uma área repleta de capim, por isso batizou-se a comunidade com este nome - Baixa do Capim. Criava-se gado ali, além do cultivo do fumo, como meios de sobrevivência para o povo.
Em 1975, minha primeira filha, Marileide, ia para a escola feliz, alegre e muito satisfeita. Mas quando teve que fazer o ensino médio ficou mais complicado: tinha que ir estudar na cidade. Eu tive que vender uma espingarda minha de estimação para lhe comprar passagens de ônibus para ir à escola. No entanto, vejo que valeu muito a pena. Ela foi a primeira a se formar. Tornou-se professora. Foi por esta época que havia chegado a energia elétrica. Antes disso se usava lampiões a gás ou querosene, ou mesmo velas. Para se tomar banho o costume era só fazê-lo de oito em oito dias. Banho de verdade com sabão feito de sebo. Enquanto isso nos banhávamos nos rios e açudes aqui da região durante o restante da semana.
Quando havia festa durante a Semana Santa, eu e meus amigos fazíamos bonecos de Judas com folhas de bananeira: isso era bom demais. Era a tradicional malhação do Judas. Sempre que íamos à festa, quando éramos adolescentes, tinha que ser acompanhado por um adulto, e muitas vezes meu pai não deixava sair, e eu e meus irmãos íamos para a rede chorar a noite inteira. A minha sorte e de toda a comunidade é que naquele tempo não havia tantos ladrões, mas se houvesse eles sairiam de bolsos vazios, porque a gente não tinha dinheiro, não tinha um tostão. Não nos preocupávamos como hoje com roupas ou bens materiais, tudo era mais simples e as pessoas mais humildes. Nas festas e bailes que íamos tínhamos sempre umas paqueras, mas quem namorava tinha que manter distância da namorada, pois era proibido ficar um encostado no outro. Um dia, enquanto curtia a festa, um primo meu chegou a mim e disse: "Oh, Pedrina está apaixonada por tu, viu". Eu respondi-lhe: "Eu, um pobre coitado?". Fiquei envergonhado, eu confesso. Mas graças ao meu primo-cupido hoje estou casado com ela.
Quando moleque a gente tinha medo de lobisomem e de um tal "vacinador". Quando diziam "lá vem o homem da vacina!", todo mundo corria, sobretudo as crianças. Esse medo era por causa das pessoas que ficavam inventando histórias fantasiosas sobre essas coisas. No caso do vacinador não era uma ficção, era um agente de saúde do governo. Mas quem era ignorante tinha medo de vacina. Às vezes, durante à noite, todos se sentavam em volta da fogueira. Certa vez, reunidos na frente de casa aparece no meio da noite uma luz estranha vindo em nossa direção, aí todos saíram correndo e entraram dentro de casa ou para dentro do mato, quando na verdade era somente um automóvel com seus olhos acesos, pois era raro aparecer algum ali, principalmente pela noite. No ano de 2000 fizeram aqui no sítio um restaurante chamado "Buchada do Vavá", que até hoje existe por preparar uma deliciosa Buchada de Bode. O mesmo se localiza em frente à escola e vizinho a igreja.
   Em 2004, como presidente da associação comunitária pude ajudar na construção de setenta casas de alvenaria, e assim, todos puderam ter sua própria casa. Tenho muito orgulho de contar para vocês minha história, relembrar as experiências pelas quais passamos e vivemos e que fazem parte de nós. São sempre lembranças as quais tenho prazer em contar para os mais novos, que muitas vezes ao ouvi-las, não têm ideia das lutas que travamos para que hoje muitos aqui da Baixa do Capim tenham o direito de estudar e trabalhar.